Discordando ou não da "guerra cambial" do ministro da Fazenda, Guido Mantega, e do "tsunami monetário" da presidente Dilma Rousseff, o que é fato é que as medidas tomadas para conter a valorização do real funcionaram.
Em 1º de março, a Fazenda fez a primeira das duas alterações no Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) e o Banco Central (BC) colocou uma limitação nas operações de pré-pagamento de exportações. Depois vieram as compras à vista de forma mais contundente. Sem contar as ameaças.
Nesses dois meses, o preço do dólar comercial subiu 10,9%. Considerando o mesmo período, o dólar também ganhou de outras moedas emergentes, como o rand sul-africano, dólar australiano e peso mexicano. Só que a valorização do dólar sobre o real foi de três a cinco vezes maior.
Na segunda-feira, a moeda americana subiu 1,06%, para R$ 1,907, maior cotação desde 21 de julho de 2009. Na BM&F, o dólar para junho ganhou 0,99%, para R$ 1,9195, antes do ajuste final.
Em setembro do ano passado, quando o dólar também tinha ido acima de R$ 1,90, o BC mudou de estratégia e veio ofertar dólares ao mercado.
A visão prevalente era de que a alta no preço da moeda americana poderia prejudicar a inflação de 2011, que já estava bem elevada.
Agora em 2012, com a inflação bem comportada no curto prazo e um governo engajado em uma política industrial, a autoridade monetária deve esperar mais ou mesmo não atuar para frear a valorização no preço do dólar.
Fica a dúvida se o mercado não vai querer testar esse "limite" da relação dólar e inflação. No pior dos casos, se o BC tiver de atuar na venda de moeda seria um grande retrocesso das tropas do governo dentro da guerra cambial.
Com uma alta de 10,9% em dois meses fica o espaço para uma realização de lucros com o dólar. No entanto, o vendido continua pensando duas vezes antes de abrir posição justamente em função da sinalização dada pelo governo de que o real não pode e não vai se valorizar.
Mesmo aos arbitradores externos, as taxas para operações envolvendo o real estariam bastante atrativas. Mas o potencial de ganho parece menor, pelo menos por ora, que o risco de tomar uma invertida do governo.
Avaliando a questão, o sócio da Global Financial Advisor, Miguel Daoud, pondera outros fatores que explicam tal comportamento do dólar por aqui.
Primeiro, o fluxo financeiro mais modesto em 2012. Para Daoud, as empresas e bancos que aproveitavam o crédito externo barato para fazer empréstimos por aqui estão repensando a estratégia em resposta à postura do governo.
Outro ponto que também passa pelo governo e deixa os investidores mais cautelosos é o aumento da interferência no setor privado. A gasolina defasada e a "guerra" dos spreads bancários são um exemplo, diz Daoud.
Outro ponto que tira atratividade do real é a possibilidade de recuo no preço das commodities. Para Daoud, a China não deve manter o ritmo de compras no atual nível de preço.
Passando para os juros, as taxas apontaram para cima na segunda-feira, mas o limitado volume do dia, um dos menores do ano, tira representatividade da movimentação. O que é fato é que o mercado segue apontando em Selic abaixo de 8,5%.