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Maioria relaciona real valorizado à redução no preço dos alimentos

De acordo com o levantamento, 35% dos brasileiros acreditam que o real mais forte oferece benefícios

A maioria da população brasi leira (68%) defende que o real se mantenha valorizado em relação ao dólar e um em cada quatro brasileiros acreditam que a redução dos preços dos alimentos está relacionada com a moeda nacional forte. Esses resultados, revelados por pesquisa do Instituto Análise, indicam que o debate sobre a política cambial na campanha presidencial pode ser relevante não só para empresários e mercado financeiro, mas também para os mais pobres.

 

De acordo com o levantamento, 35% dos brasileiros acreditam que o real mais forte oferece benefícios, em especial aos pobres, e 24% acreditam que o dólar desvalorizado deixa os alimentos mais baratos. Responsável pela pesquisa, Alberto Carlos Almeida, diretor do Instituto Análise, explica que, apesar da complexidade do debate sobre a política cambial, a população percebe no bolso as oscilações da cotação do dólar no país. "A maioria da população sabe até os centavos do que gasta no supermercado", comenta Almeida. "Apenas um grupo muito pequeno não sabe o quanto gasta nas compras."

A percepção de que a valorização do real é importante é registrada sobretudo nas regiões Norte e Centro Oeste e entre os que declararam ter estudado até o nível médio. Almeida ressalta que o assunto ganha mais relevância no debate eleitoral em um contexto de aumento da renda e de acesso ao mercado de consumo, com a ascensão de milhares de pessoas à classe C.

Na avaliação de 49% dos entrevistados pelo Instituto Análise, é melhor ter dólar mais fraco, com a consequente redução nos preços dos produtos, ainda que isso gere desemprego na indústria. Outros 33% analisam que ter empregos no setor industrial é mais importante do que gerar postos de trabalho no comércio ou diminuir os preços. O instituto de pesquisa ouviu 1 mil pessoas na última semana de outubro de 2009, em seus domicílios. A margem de erro da pesquisa é de três pontos percentuais, para mais ou menos.

O tema da política cambial ainda não foi tratado abertamente pelos principais pré-candidatos à Presidência. A ex-ministra Dilma Rousseff , do PT, sinaliza que deve manter a política do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, com o câmbio flutuante, sem intervenções. O pré-candidato do PSDB, ex-governador José Serra, não explicitou suas ideias sobre a questão. Alguns economistas ligados ao seu grupo político dentro do partido defendem o controle mais forte do governo, por meio do Banco Central. Ressaltam, no entanto, que o regime cambial deve continuar flutuante.

A última eleição marcada de maneira relevante pelo nó cambial foi a de 1998, quando a gestão Fernando Henrique Cardoso resistiu a pressões dentro e fora do governo para desvalorizar a moeda durante a campanha. A mudança no câmbio acabou acontecendo em janeiro, com a queda do presidente do Banco Central, Gustavo Franco.

O próximo presidente terá de lidar com os efeitos da valorização do real nas contas externas do país. Em 2009, após cinco anos de resultados positivos, o balanço de transações correntes fechou negativo. A expectativa para este ano, segundo pesquisa realizada com instituições financeiras pelo Banco Central, o boletim Focus, é de déficit em conta corrente de US$ 50 bilhões. Para 2011, quando o sucessor do presidente Lula assumir, a estimativa é de déficit de US$ 60 bilhões em conta corrente. Para a balança comercial, os bancos preveem saldo de R$ 10 bilhões neste ano e R$ 3, 99 bilhões para o próximo ano.

Exportadores e empresários que vendem para o mercado interno e que competem com manufaturados importados, especialmente da China, defendem uma política mais intervencionista do governo sobre o câmbio. Na avaliação do economista Paulo Gala, da Fundação Getúlio Vargas (FGV) de São Paulo, existe divisão do governo em relação ao câmbio valorizado. O Ministério da Fazenda faz esforço para contornar a valorização do real, ao, por exemplo, criar o Fundo Soberano, no qual o governo compra dólares e emite dívida em reais. Por outro lado, o Banco Central não teme o atual cenário porque o real valorizado ajuda a controlar a inflação.

Além do efeito nas contas externas, Gala cita o impacto negativo sobre a competitividade industrial em relação a outros países. O economista da FGV diz que o Brasil tem diferenças com a Ásia, onde o modelo de crescimento de desenvolveu com desvalorizações cambiais. "Numa economia com câmbio apreciado, como o Brasil, o crescimento é puxado pelo consumo interno, o que acaba resultando em déficit em conta corrente. No modelo asiático, o crescimento foi puxado pelas exportações", afirmou Gala, para quem o governo poderia ser mais agressivo na utilização do Fundo Soberano. "O fundo está pronto, mas o governo está usando de forma tímida", afirmou o economista da FGV.