Paola de Moura
A queda dos juros pode ajudar finalmente a alavancar o mercado secundário de dívidas. Assim espera Carlos Rocca, coordenador do Comitê Técnico do Plano Diretor de Mercado de Capitais, que será lançado oficialmente hoje em evento na Comissão de Valores Mobiliários, no Rio. Serão apresentadas 50 ações específicas para desenvolver o mercado de capitais, mas, segundo o coordenador, a mais importante delas é aumentar o espaço e o interesse na negociação das dívidas privadas. Principalmente depois do salto que o mercado secundário de debêntures deu este ano em relação à pessoas físicas, com 14% de participação nas emissões, contra 0,1% em 2008.
O plano propõe mudanças na tributação das negociações de debêntures, commercial papers e notas promissórias, entre outros. O principal problema está na cobrança de Imposto de Renda (IR). Segundo o professor de tributação no mercado financeiro do Insper André Franco de Moraes, o que ocorre é a cobrança em dobro do imposto. Ele explica que o IR é cobrado sobre a valorização do título desde sua emissão e quem compra no mercado secundário vai pagar o imposto sobre os juros contando a rentabilidade sobre o valor de face do papel e não sobre a valorização que teve desde que adquiriu o papel.
Além disso, a legislação dá benefícios fiscais aos investidores estrangeiros não residentes em paraísos fiscais, aqueles previstos na resolução 2.689/2005 do Banco Central, de acordo com o tipo de investimento e o mercado. Já o brasileiros não recebem o mesmo tipo de benefício. Segundo a advogada tributarista Mariana Miranda Lima, do escritório Lobo & De Rizzo Advogados, os investidores do mercado financeiro questionam os motivos de o governo dar isenção de imposto aos estrangeiros e não aos brasileiros. "Já há uma ação tramitando na Justiça para igualar o benefício", explica a advogada.
Outra diferenciação no mercado é o tratamento dado a instituições financeiras. Enquanto pessoas jurídicas têm a retenção do Imposto de Renda (IR) na fonte, segundo tabela regressiva que varia 22,5% a 15% em função do prazo do investimento, mais 9% de Contribuição sobre Lucro Contábil (CSL), e posteriormente fazem a compensação total dos 34% sobre a receita financeira na declaração, os bancos, por exemplo, só oferecem a tributação na declaração, explica a tributarista. "Hoje, o mercado secundário destes títulos praticamente não existe", afirma o professor André Moraes. "O que mais ocorre são negociações entre grandes instituições ou fundos", conclui o professor.
O vice-presidente da Associação Nacional de Bancos de Investimentos (Anbid), Alberto Kiraly, concorda que há um gargalo no desenvolvimento do mercado secundário de títulos da dívida. "A queda da taxa de juros fez o investidor pessoa física se interessar pelas debêntures e, neste ano, houve boas oportunidades com empresas sólidas e um valor de investimento mínimo baixo", explica Kiraly. Só até julho de 2009, cerca de 12% do total de debêntures oferecidas no mercado, aproximadamente R$ 6,817 bilhões, foram adquiridas por pessoas físicas, num total de R$ 957 milhões.
Alberto Kiraly acredita que este número pode crescer ainda mais se os entraves do mercado caírem. "É importante ter um mercado secundário forte desses papéis para aumentar a liquidez e permitir ao investidor, que procura taxas maiores no longo prazo, possa se desfazer do investimento caso tenha um imprevisto", conclui.
Para Carlos Rocca, este é o momento ideal para o governo mudar esta cobrança. O coordenardor explica que fundos de investimentos de renda fixa, que estão perdendo rendimento em função da queda da taxa de juros, poderão migrar para o mercado de dívida privada.
O professor diz que o aumento das negociações terá um efeito positivo para este mercado, já que a consequência será o crescimento do interesse de novos investidores.